Em 1307, Filipe, o Belo, Rei de França, inicia o seu processo de extinção da Ordem dos Templários, apoiado pelo "seu" papa, Clemente V, o "pastor sem lei" que Dante colocou no Inferno. Filipe conhecera o poderio da Ordem quando esta lhe deu guarida ao se revoltar contra o seu pai; usando a táctica de apagar as dívidas matando os credores, conseguiu a extinção e tentou convencer todos os seus pares a fazer o mesmo. Por toda a Europa, com a Inquisição à perna, os templários são despojados dos seus bens, presos, torturados, acusados de apostasia, idolatria e de ritos satânicos entre os quais a prática de sodomia em rituais secretos de iniciação. Nas Ordenações Afonsinas, documento quatrocentista, ao condenar-se a sodomia explica-se que "por este pecado foi destruída a Ordem do Templo por toda a Cristandade em um dia". Do alto do cadafalso, o último mestre proclamou bem alto a sua inocência e profetizou que, antes de decorrido um ano, o papa e o rei estariam a prestar contas a Deus pelo sucedido, o que na realidade veio a acontecer.
O apelo papal não foi seguido logo em 1312, data da bula de extinção, por todos os reis cristãos; em Portugal, esta Ordem irá sobreviver; no nosso país de brandos costumes, logo D. Dinis, grato à sua acção e sem razão de queixa, consegue, após quatro anos de negociações com o Papa, um inteligente e diplomático artifício para a salvar criando uma nova ordem de cavalaria circunscrita ao seu Reino, de espírito e regra similares: em 1319, João XXII concede a bula que transforma esta Ordem na de Cristo, para defender o reino dos mouros, com transferência de graus, privilégios e bens, com sede em Castro Marim, na raia, transformada em casa-mãe por estar mais perto da moirama que era preciso expulsar. Só D. Pedro I, em 1357, consegue que a sede da ordem regresse a Tomar, após 36 anos de afastamento. A sua coragem permanece notória. Na sua regra, está escrito: "o cavaleiro de Cristo é um cruzado permanente empenhado num duplo combate: contra a carne e contra o sangue, contra as potências espirituais malignas nos céus. (...) Não receia nem homem nem demónio. (...) Avançai com firmeza e afastai os inimigos da Cruz de Cristo!".
A partir de 1418, é o Infante D. Henrique quem vai governar a Ordem de Cristo. Por nomeação pontifícia, torna-se também seu perpétuo administrador. O grão-mestre Vasco Fernandes e os outros cavaleiros de Cristo terão então um grande papel nos Descobrimentos, pois a sua regra é articulada de modo a poderem os cavaleiros participar nessa gesta com homens e fundos. Tal como a sua antecessora - a Ordem dos Templários - teve um grande papel na Reconquista, a Ordem de Cristo terá outro grande papel na Epopeia dos Descobrimentos, como suporte ideológico e material. A sua cruz irá então pelos mares, nas velas nacionais, a todos os continentes.
in SACADURA, João Paulo; Cunha, Rui - Património da Humanidade em Portugal - Volume I, Editorial Verbo, 2006, pág.140 e ss.
E a terra conquistada, o seu povoamento e defesa? Lançados ao mar, quem administra e protege a terra? Desse papel pouco se fala, mas a quem o desempenhou muito se deve. Falamos de uma outra Ordem, da Ordem dos Hospitalários. Mas, por ora, ficamos por aqui.
Sem comentários:
Enviar um comentário